Publicar em revista, em anais de eventos ou como preprint?

Está em dúvida sobre qual publicação é a mais adequado para os resultados que tem no momento? Confira se você deve publicar um artigo em periódicos, um trabalho em anais ou um preprint.

Era um sábado em que a família se reuniria em um churrasco de aniversário. Mas não a família completa. Paula estava com as chaves do laboratório de seu departamento na universidade e era lá que ela passaria a tarde toda, solitária, em busca de respostas e correções de dados em suas intermináveis tabelas.

Faltava tão pouco e, ao mesmo tempo, tanto para que ela chegasse a alguma conclusão. Eram tantas as perguntas e tantas as possibilidades ainda. O seu trabalho já estava bem avançado e suas hipóteses levantadas ainda eram possíveis de serem comprovadas, mas tudo dependia de sua atenção aos detalhes, de sua análise minuciosa dos resultados e de interpretar esses resultados corretamente.

Paula sabia que poderia escrever e publicar o que já alcançou na sua pesquisa, mas precisava de mais para concluí-la por completo. Nesse caso, qual publicação seria mais vantajosa para ela neste momento de seu trabalho? Artigos em revistas, trabalhos em anais de eventos ou preprints? Isso é o que discutiremos aqui.

Por que publicar uma pesquisa científica?

Publicar faz parte das atribuições de todo pesquisador. Durante a Revolução Científica, iniciada no século XVI, a comunicação dos resultados e discussões de pesquisas eram feitas por cartas e se mantinha discreta e encapsulada nas “panelas” científicas.

Hoje, aumentaram as formas de se comunicar a ciência, principalmente porque há pressão, e polêmicas sobre isso, de agências de fomento e instituições de ensino para que os acadêmicos publiquem continuamente, já que esse é um dos critérios de avaliação de qualidade de cursos nas universidades.

Isso acontece porque a publicação é vista não só como a consolidação de um trabalho e a possibilidade de aplicação de suas descobertas, como a devolutiva que pesquisadores fornecem à sociedade, já que muitas vezes suas pesquisas são financiadas por órgãos públicos.

Se antes a melhor maneira de trazer visibilidade a um trabalho científico era a publicação em alguma renomada revista científica, hoje existem mais opções e formatos, como apontou Danilo Albergaria em matéria para a Revista FAPESP de Maio de 2017.

“O advento da internet mudou profundamente a maneira como os papers são disseminados na comunidade científica. Por um lado, periódicos impressos passaram a publicar seus conteúdos on-line, mas com acesso restrito, garantido por assinatura ou remuneração por artigo acessado. Por outro, a internet abriu uma via para a criação de publicações de acesso aberto que só existem on-line, como a PLOS ONE, e de repositórios de preprints, como arXiv e bioRxiv, que disponibilizam manuscritos para leitura e comentários antes de serem submetidos aos periódicos para publicação” – Danilo Albergaria em Revista FAPESP

Além dos artigos para periódicos e dos preprints (artigos publicados em repositórios abertos online, que não passaram por peer-review) são também muito relevantes para promover o trabalho de qualquer cientista a publicação em anais de eventos, plataformas equivocadamente desvalorizadas em diversas áreas, mas que, se bem elaboradas e divulgadas, podem trazer grande visibilidade e retorno positivo aos pesquisadores.

Anais de Eventos e Proceedings?

Como já caracterizamos em um post bem dedicado ao tema, anais de evento ou conference proceedings, em inglês, é o formato mais popular de se publicar os conteúdos apresentados em um congresso, conferência ou outro tipo de evento científico. Eles são uma coletânea de conhecimentos que geralmente passam por validação, além de serem documentos históricos de todas as submissões aprovadas e suas discussões durante a edição de um encontro científico.

Assim como nas revistas científicas, a avaliação e aquisição de trabalhos e a consequente publicação dos anais de congressos, por exemplo, é feita através do sistema peer-review. Porém, na maioria dos casos com menos rigor que em uma revista científica, já que o tempo conta bastante no processo de organização de eventos.

Além disso, o trabalho de um pesquisador em um evento não consta somente do texto em si, mas da soma de sua presença e participação no encontro e debates, que poderá preencher lacunas, esclarecer dúvidas e provocar novas discussões.

Em áreas como a Ciência da Computação e de pesquisas aplicadas na indústria, as publicações em anais de eventos prestigiados são a maior fonte de consulta e se tornaram o grande objetivo dos pesquisadores na hora de escolher onde apresentar seus resultados. Isso se deve ao ritmo acelerado e às dinâmicas de trabalho nessa área, em que tudo muda muito rápido e existe grande cooperação entre os pesquisadores.

Para se ter noção em números sobre isso, uma pesquisa interna da biblioteca digital da International Society for Optics and Photonics (SPIE), uma importante plataforma de eventos e publicações interdisciplinares de pesquisa sobre a luz, constatou que entre 2004 e 2009, 54% das publicações nas áreas de engenharias eram feitas em proceedings, contra 36% em revistas científicas e 10% em outras plataformas.

A mesma pesquisa mostrou que 42% das publicações nas áreas de física e ótica eram publicadas em proceedings e que o crescimento de publicações em anais de eventos, desde 2000 até 2009, cresceu 141%, enquanto em revistas da mesma área foram de apenas de 43%. Como consequência, a consulta e as citações de anais de eventos também cresceram nos últimos anos. A pesquisa ainda ressalta que entre 2000 e 2010, nas engenharias as citações de proceedings foi de mais de 10%.

Muitas outras áreas poderiam se beneficiar dessa dinâmica inclusiva, rápida e de valorização de processos dos proceedings sem perder a avaliação por pares, mas, infelizmente, ainda não são todas as conferências e congressos que publicam anais de qualidade ou que têm prestígio e divulgação suficientes para despertar o interesse de pesquisadores.

Outra vantagem dos anais de eventos que alguns organizadores ignoram é que os proceedings podem ser liberados de diversas formas, como impressos somente no evento ou online com acesso restrito ou online e aberto ao público no geral. Cabe a cada pesquisador se informar com antecedência sobre como os proceedings do evento serão publicados e se ele tem interesse em aproveitar os benefícios que esse tipo de publicação pode oferecer.

Anais de eventos têm uma dinâmica inclusiva, rápida, de valorização de processos e o que mais?

Publicar um trabalho em anais e proceedings de eventos é uma ótima opção para pesquisas ainda em desenvolvimento, como o caso da Paula mencionado acima. São nos anais de eventos que os pesquisadores têm a chance de passar pela revisão dos pares e também de discutir seus estudos antes de partirem para uma versão final.

Por exemplo, se uma pesquisa ainda está em uma estrutura fora dos padrões normatizadores de uma revista científica, a possibilidade da revisão ser mais flexível e valorizar trabalhos criativos e desafiadores é maior na publicação de proceedings, já que de modo geral os eventos tendem a ser estruturados para reunir participantes com visões diferentes e novas propostas, sem a necessidade de seguir normas rígidas. Além disso, dificilmente editores de periódicos se interessam por resultados negativos ou inconclusivos, enquanto eventos podem englobar trabalhos em diferentes estágios para que o debate fomente o avanço da pesquisa.

Outro ponto importante para se avaliar no momento de decidir onde publicar a pesquisa é que os anais de eventos, quando bem feitos e divulgados, são ótimas ferramentas de propaganda para os autores e seus trabalhos, pois dialogam com diversos pesquisadores que estiveram presentes no evento e querem participar dos próximos.

O Galoá, por exemplo, está revolucionando a forma de se fazer proceedings, trazendo mais destaque aos textos no pós-evento e facilitando a busca por resumos e artigos por título e autor. O Galoá também acompanha estatísticas de acesso e faz também a divulgação do evento em seus canais, que são acessados por acadêmicos de todo o país, como na série “Pesquisa em destaque”.

Também por serem mais rápidos e não tão rigorosos, os proceedings são ótimas chances de novos pesquisadores praticarem e iniciarem sua produção acadêmica, além de poderem aprender com pesquisadores em diversos níveis de atuação para promover seu nome e seu trabalho, conhecer outros pesquisadores e com isso ter boas oportunidades de parcerias e empregos

Além dos benefícios comuns a todos, as publicação em proceedings são relevantes para pesquisadores com mais experiência também. Os mais experientes podem incluir orientandos em seus projetos e utilizar a oportunidade de publicação em anais de eventos para treinar seus estudantes e/ou de se destacarem e se manterem conhecidos em meio a discussões atuais.

Proceedings e preprints são as publicações ideais para pesquisas em andamento

Atemporalidade, custo, rigor, presença no evento, patentes, necessidade de acesso aberto são alguns dos fatores na hora de escolher em que tipo de publicação será mais condizente com os interesses de cada cientista.

Existem inúmeras discussões em fóruns de pesquisadores sobre a viabilidade de se publicar em anais de eventos e, posteriormente, em revistas científicas. Muitos eventos exigem sim trabalhos inéditos, assim, como os periódicos. Cabe aos organizadores e editores deixarem essa informação clara, assim como aos pesquisadores fazerem um planejamento e se informarem antes de tomarem qualquer decisão. Por essas restrições, os preprints são cada vez mais considerados e respeitados.

Como são várias as revistas científicas de impacto que aceitam publicar artigos finais de pesquisas que já foram discutidas em proceedings, podemos dizer que a publicação em ambos se complementam. Uma promove a outra. Anais de eventos apresentam e promovem o estado da arte das áreas que representam, enquanto as revistas são bases de construção de conhecimentos.

Paula ainda quer discutir seu trabalho, que não está finalizado. Ela se beneficiaria muito ao publicá-lo nos anais de um evento que tenha interesse e disponibilidade de participar, pois poderia trocar informações sobre seus resultados e dúvidas, encontrar novas parcerias e já começar a fazer uma propaganda do que o trabalho final poderá trazer.

Provavelmente uma revista de alto impacto não aceitaria um artigo no estágio em que a pesquisa de Paula se encontra, além disso, por que partir para uma única publicação se ela pode começar a mostrar seu trabalho e, em seguida, fazer a exposição final dos resultados? Dependendo da visibilidade que Paula alcançar com os proceedings, ela terá uma base também para decidir se vale a pena enviar e aguardar todo o processo de um grande periódico ou já lançar o artigo final como preprint, pois essa também é uma opção democrática, mais rápida e que pode ter um grande impacto, afinal, tudo está na internet. O segredo é saber não só o que escolher, mas quando, e para que finalidade.

Leia mais:

Referências:

ALBERGARIA, Danilo. Visibilidade Imprevisível. Pesquisa FAPESP, 2017 [visualizado em 13 de Março de 2018]. Acessível em http://revistapesquisa.fapesp.br/2017/05/23/visibilidade-imprevisivel/

PATRUS, Roberto, CABRAL DANTAS, Douglas, SHIGAKI, Helena Belintani, Pesquisar é preciso. Publicar não é preciso: história e controvérsias sobre a avaliação por pares. Avaliação: Revista da Avaliação da Educação Superior [online] 2016, 21 (Agosto-Novembro) : [Visualizado em 13 de Março de 2018] Acessível em <https://www.researchgate.net/post/Should_conference_papers_be_counted_as…

RESEARCHGATE Forum, If research is published in conference proceedings, can it still be published in journals , 2013 [visualizado em 13 de Março de 2018]. Acessível em https://www.researchgate.net/post/If_research_is_published_in_conference…

SPIE, Value of Proceedings, 2015 [visualizado em 04 de Março de 2018]. Acessível em https://spie.org/Documents/Publications/Value-of-Proceedings.pdf

Sobre o Autor

Fabiano Sant'Ana é o CEO e CVO do Galoá Science. Matemático Aplicado formado na Universidade de Campinas, a mais de uma década Fabiano trabalha diariamente com pesquisadores das mais diversas áreas automatizando tarefas, reduzindo esforços e maximizando o impacto da pesquisa científica brasileira.