O acesso aberto é mais amplo que apenas um acesso gratuito de revistas científicas

Quase 15 anos depois da consolidação do Movimento do Acesso Aberto pelo mundo, a América Latina lidera as demais regiões em revistas de acesso irrestrito, além de outras ações que preservam o direito patrimonial dos autores, como as políticas públicas argentina com a promoção do Sistema Nacional de Repositório Digital em 2011, mesmo ano que se estabeleceu a Red Mexicana de Repositories Institucionales. No entanto, segundo Sueli Ferreira, pesquisadora e professora de biblioteconomia da Universidade de São Paulo (USP), muitas pessoas ainda confundem o acesso aberto apenas como acesso gratuito ao conteúdo das revistas científicas ou ainda com a existência de periódicos eletrônicos, sendo que na verdade é um posicionamento político muito mais amplo e que atinge a questão dos direitos autorais das publicações e de outras informações científicas.

Sobre o tema, a primeira edição deste ano da revista TransInformação (v.28, n.1, 2016) trouxe um artigo de Michelli Costa e Fernando Leite que resgata a história dos 10 primeiros anos do acesso aberto no mundo e na América Latina, tomando como ponto inicial a Declaração de Budapeste sobre o Open Access em 2002. Mais conhecido como Budapest Open Access Initiative, o evento consolidou vários conceitos importantes para definição do acesso aberto, como as licenças que classificam “quão aberta” uma publicação pode ser, além das vertentes do movimento, que são as vias dourada e verde.

A via dourada é o caminho adotado pelas revistas que permitem o acesso irrestrito de leitura de seus artigos, sendo que em números totais o Brasil é o segundo país do mundo com mais títulos em acesso aberto, atrás apenas dos Estados Unidos. Ao contrário do que algumas pessoas podem se confundir, Ferreira lembra que uma revista não basta estar disponível na internet para ser considerada de acesso livre, afinal, ela pode ser paga e gerenciada pelas grandes editoras comerciais. O periódico ser gratuito também é considerado apenas um passo do acesso aberto, isso porque o conceito vai atingir os direitos patrimoniais dos artigos que normalmente são concedidos gratuitamente aos editores:

“Nós publicamos em uma revista e assinamos um documento no qual transferimos os direitos autorais daquele artigo para a revista, por isso só quem paga aquele conteúdo tem acesso. O grande foco não que todas as etapas sejam de graça, mas que tenhamos condições de ter uma discussão sobre os direitos autorais do artigo”, explica Sueli Ferreira.

Se voltarmos um pouco na história recente da comunicação científica, podemos perceber que os debates sobre um acesso livre se intensificaram com os altos valores para aquisição das revistas, com aumentos acima da inflação. Segundo a dissertação de mestrado de Solange Santos, defendido na USP em 2010, entre os anos de 1986 a 2002 o valor das assinaturas de periódicos nos Estados Unidos aumentou 200%, enquanto a inflação sofreu aumento de 68%. A contradição é que os autores e as instituições que financiaram a pesquisa publicada, em sua maioria instituições públicas, só podem ter acesso aos conteúdos se pagarem as revistas, enquanto os artigos continuam geram lucros para as editoras comerciais. Contexto que motivou até a “Primavera Acadêmica” em 2012, na qual várias bibliotecas universitárias de renome (como da Califórnia e de Harvard) pararam suas negociações com as editoras comerciais em protesto contra a política agressiva de preços, motivados pela campanha The Cost of Knowledge de Timothy Gowers, matemático medalhista da Fields. Vale destacar que em estudo publicado pela PLOS One no ano passado (The Oligopoly of Academic Publishers in the Digital Era) aponta que 68% a 75% da renda das grandes editoras comerciais vêm de bibliotecas universitárias.

Uma das soluções que são adotadas hoje, após a Declaração de Budapeste, para as publicações (principalmente as que não estão em revistas que seguem a via dourada) é a via verde formada por repositórios das instituições ou dos autores que depositam os artigos em preprint (versão antes da avaliação por pares) ou postprint (versão publicada em um periódico). No entanto, em postprint as instituições e autores devem ter “sinal verde” das revistas para o depósito. Os repositórios também depositam outros conteúdos científicos, como teses, dissertações, manuais, etc, além de poderem integrar políticas públicas como as realizadas no México e Argentina, e políticas institucionais das universidades e outras centros de pesquisa.

A pesquisadora Sueli Ferreira argumenta que o acesso “mais aberto” de um artigo é aquele em que além do material estar em revistas da via dourada, também é automaticamente depositado nos repositórios institucionais (via verde). Porém, muitos editores brasileiros continuam mantendo o direito patrimonial dos artigos alegando que a revista já está disponível gratuitamente para todos os leitores e que o depósito em repositórios pode dispersar a contabilidade de downloads e acessos da revista. Ferreira expõe a contradição desse pensamento, pois quanto mais indexada e depositada a revista estiver, maior será o acesso àquele material e seu impacto dentro das comunidades acadêmicas, sendo que as novas tecnologias de softwares abertos garantem a interoperabilidade entre os sistemas para que isso ocorra automaticamente em muitos casos, sendo “responsabilidade dos editores contabilizar o acesso em todos os lugares que os artigos estejam”.

Ficou curioso para saber como depositar suas publicações em acesso aberto? Entre em contato com o Galoá! Nós lhe ajudamos com todo processo. Como somos membro autorizado da Crossref, depositamos o DOI de sua publicação.

E para facilitar a compreensão dos princípios do acesso aberto, com base no guia How Open is It? desenvolvido pela SPARC (Scholarly Publishing and Academic Resources Coalition) e a PLOS One (Public Library of Science), nós do Galoá desenvolvemos um infográfico dinâmico sobre os níveis de quão aberta uma produção pode ser em cada categoria: para preservar os direitos dos leitores, dos autores, de depósito dos autores, de depósito automático, de reutilização e de acessibilidade das máquinas. Confira, comente e compartilhe para continuarmos discutindo o tema! 

 Quer usar o nosso infográfico no seu blog ou site? Saiba como usar e referenciar aqui.

Fontes:

COSTA, Michelli Pereira da, & LEITE, Fernando César Lima. (2016). Open access in the world and Latin America: A review since the Budapest Open Access Initiative. Transinformação, 28(1), 33-46.

FERREIRA, Sueli. Brasil é referência em acesso aberto, mas faltam políticas integradas: depoiment. [10 de março de 2015]. Entrevista concedida a Kátia Kishi

LARIVÌERE, V.; HAUSTEIN, S.; MONGEON, P. The Oligopoly of Academic Publishers in the Digital Era. PLOS One, 2015.

SciMAGO. Journal Rank – Open Access, 2015 [visualizado 26 July 2016]

SANTOS, S.M. Perfil dos periódicos científicos de ciências sociais e humanidades: mapeamento das características extrínsecas. 2010. Dissertação (Mestrado) – Escola de Comunicação e Artes, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010.

SPARC e PLoS ONE. How Open is it?, 2014 [visualizado 26 July 2016]

Equipe do Galoá science

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