O Qualis Periódicos é um assunto recorrente no cotidiano da maioria dos pesquisadores, pós-graduandos e até mesmo alguns graduandos que buscam antecipar experiências com publicações em revistas científicas.
Esse termo é muito polêmico porque o Qualis classifica a “qualidade” de todos os periódicos gerenciados no Brasil, sendo que os mais bem avaliados recebem mais reconhecimento, parcerias e verba, aumentando as chances de que os artigos tenham mais visibilidade também.
Alguns programas de pós-graduação também são avaliados pelo volume e visibilidade das publicações de seus alunos, motivo para muitos pressionarem que os pós-graduandos publiquem em revistas consideradas A1 ou A2 em suas áreas. Da mesma forma, algumas instituições avaliam seus docentes e pesquisadores pela sua produtividade, que, assim como nos cursos, além do volume também avaliam onde foram parar seus artigos.
Contexto para aumentar ainda mais o desejo das revistas estarem nos estratos mais altos de avaliação, já que também receberão mais submissões de trabalhos para publicar os destaques de suas áreas que vão trazer mais citações para permanecer nos altos estratos.
Esse processo de produção da ciência deixa claro que provavelmente a maioria das revistas brasileiras vão buscar caminhos para se classificarem melhor, embora existam linhas editoriais que não se prendem a indicadores por acreditarem que o que qualifica um periódico é todo trabalho editorial envolvido que deve ser avaliado caso a caso.
Mas para não deixar o tema no “achismo”, resolvemos resgatar um artigo de Mônica Frigeri e Marko Monteiro, pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), publicado na Revista Estudos de Sociologia da Universidade Estadual Paulista (UNESP) sobre como o Qualis Periódicos interfere na rotina dos editores científicos.
Além do levantamento bibliográfico, os pesquisadores entrevistaram editores de revistas da área de Educação e fizeram uma pesquisa etnográfica, metodologia usada para se compreender uma cultura, sobre as práticas editoriais. O diagnóstico final foi que as avaliações do Qualis Periódicos orienta e constrói o dia a dia das revistas para estar nos estratos mais altos, mas vale entender como isso ocorre, por isso vamos resumir alguns pontos apresentados no artigo de Mônica Frigeri e Marko Monteiro neste post.
Caso você queira saber mais sobre a história, mudanças e como se calcula o Qualis, recomendo que leia primeiro um post anterior sobre o tema que publicamos aqui: Qualis Periódicos, quando surgiu e como funciona?
Qualis Periódicos, o indicador científico das revistas
O Qualis Periódicos surgiu como um caminho para mensurar a produção científica promovida pelas revistas, sendo que ele classifica de A1, A2, B1, B2, B3, B4, B5 e C (com pontuação 0) quais são os veículos mais relevantes para cada área.
Esse é um dos motivos que vemos uma revista com notas tão discrepantes de área em área, por exemplo A1 em Saúde e B3 em Direito, quando sua representativa maior é na área de Saúde, apesar de agregar artigos com relação ao Direito, como direito sanitarista.
Para a avaliação, cada área tem seu comitê e regras pré-definidas que pautam como esses periódicos serão avaliados, por exemplo, existem comitês em determinadas áreas que buscam classificar com base no Fator de Impacto (FI) das revistas, método que para algumas revistas, como das Humanidades, não se aplica tão bem assim, já que os artigos precisam de mais tempo de maturação para se obter citações internacionais e, consequentemente, um alto Fator de Impacto. Caso você queira saber os critérios da sua área de pesquisa, melhor conferir direto no site da CAPES (Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior).
Pelo fato de ter percentuais específicos de quantas revistas podem ficar em cada estrato, além dos diferentes critérios de avaliação em cada área, o Qualis é bem polêmico no meio acadêmico. Mesmo com tantas controvérsias, ainda é necessário “réguas” para medir a produção científica e com esses dados poder trabalhar em cima de políticas científicas e de incentivo, sendo apresentado como um dos motivos para Frigeri e Monteiro quererem entender o tema na pesquisa realizada
No estudo, os autores escolheram quatro periódicos da área de Educação que foram classificados no Qualis Educação nos estratos A2, B2, B4 e B5. Entre os resultados obtidos, Frigeri e Monteiro descobriram que algo que colabora muito em uma boa colocação é o formato eletrônico das revistas científicas, que aumenta o acesso e visibilidade da publicação ao se comparar com a versão impressa, além de tornar o processo editorial mais simples.
“Neste sentido, o SEER – Sistema Eletrônico de Editoração de Revistas (OJS) demonstrou ser um agente importante e eficiente na gestão da rotina editorial.”
(FRIGERI, M. e MONTEIRO, M., 2014, p. 308-309)
Sobre o Qualis Periódicos, os autores exemplificam como o indicador influencia todas as decisões da revista, como um caso em que haveria nomes de autores repetidos em um mesmo dossiê, o que dependendo do tema é possível acontecer por ser algo muito específico e com poucas pesquisas. Porém, como a revista estava preocupada que a endogenia pudesse prejudicar seu Qualis (75% dos artigos devem estar vinculados a pelo menos 5 instituições diferentes), um dos critérios avaliados na Educação, o editor negociou com o coordenador do dossiê a retirada do nome do autor em um dos artigos.
O exemplo demonstra como a pressão em atender o Qualis pode prejudicar diversas tomadas de decisões dentro de uma revista.
Outros problemas que surge para se atender ao Qualis estão relacionados à periodicidade da revista, tanto por questões financeiras quando de comprometimento aos prazos por parte dos pareceristas e autores, sendo motivo para rever alguns pontos de responsabilidade com outros agentes importantes para a revista existir, fora os problemas de financiamento que alguns periódicos em estratos mais baixos sofrem, dificultando que eles invistam em melhorias na revista para conquistar um estrato mais alto.
Nesses exemplos, fica claro que a influência do Qualis na rotina dos editores não ocorre exatamente como incentivo para que essas revistas melhorem seus processos, mas muitas vezes limitam melhorias com a falta de investimento na área de publicações acadêmicas ou pressionam os editores a ponto de ocorrer alguns casos de má conduta, sendo questionável a ideia de que o Qualis reflete em qualidade para os periódicos.
Os autores do artigo concluem que mesmo que a CAPES não considere o Qualis como definição absoluta de qualidade “nas próprias práticas editoriais fica evidenciado que o Qualis reorienta a forma como os periódicos atuam, seja na padronização de práticas, seja na busca por maior indexação e menor endogenia (forma e conteúdo). Para o senso comum o Qualis já é visto como a classificação da qualidade dos periódicos científicos.” (p. 311)
Pontos gerais para um bom Qualis
Ainda nas conclusões do artigo de Frigueri e Monteiro, os autores apontam que mesmo não sendo palpável definir qualidade, a CAPES aparenta mostrar que tem qualidade o periódico com ampla circulação, artigos com autoria institucional diversificada e indexações nas principais bases de dados da área.
Fora esses pontos, aparenta ser um reflexos dos comitês de cada área valorizar como diferencial a internacionalização e uma determinada regularidade, como podemos ver no trecho a seguir:
“Do ponto de vista da própria rotina editorial a qualidade é tida como uma meta: fazer do periódico um dos mais reconhecidos na sua área. Para tanto, a equipe tem que manter a periodicidade regular dos fascículos, atualizar as indexações, manter os prazos de avaliação em dia e manter um bom relacionamento com seus colaboradores: autores, pareceristas, leitores e membros do corpo editorial.” – (FRIGERI, M. e MONTEIRO, M., 2014, p. 312)
Mesmo sem se afirmar como a qualidade do periódico, os autores observaram pela pesquisa empírica que é um indicador que está internalizado nas decisões editoriais, não sendo indicado ser negligenciado, já que afeta prestígio e financiamento para que o periódico possa se aperfeiçoar e conseguir se disseminar mais para promoção de debates científicos.
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