Por que o Fator de Impacto é criticado?

O  Fator de Impacto é a métrica mais consagrada mundialmente para avaliar, contabilizando as citações, revistas científicas dentro da cientometria, ramo da bibliometria que avalia publicações dentro da comunidade científica e auxilia na elaboração de políticas científicas.

A cientometria surgiu com a proposta de inaugurar o Fator de Impacto pelo químico e linguista americano Eugene Garfield. A importância de se ter uma métrica que calcula o impacto via citações da revista coletadas em um período de dois anos é tão grande que até mesmo nas avaliações internas dentro da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) como o Qualis Periódicos, a métrica é utilizada como método de classificação dentro dos estratos.

Mesmo com o prestígio e benefícios do Fator de Impacto (já discutido aqui, junto com a explicação do cálculo), não se pode negar que ela também apresenta muitos problemas que também merecem atenção. Isso porque nenhuma métrica será capaz de abranger todos os aspectos de uma revista científica, sendo que o ideal é correlacionar parâmetros diferentes para compreender o contexto de uma revista de forma mais completa.

Entre as lacunas que o Fator de Impacto apresenta, e são comentadas até mesmo por seu criador Eugene Garfield entre outros autores, é que os periódicos com maiores Fatores de Impacto costumam ser aqueles que publicam artigos de revisão, pois são artigos que recebem mais citações. Logo, a revista que valorizar os trabalhos inéditos e que precisam de tempo para mais análises pode se prejudicar em uma métrica como essa, pois terá menos “impacto” dentro dos dois anos avaliados após a publicação desses artigos.

Outro problema é que países em desenvolvimento como o Brasil, onde a institucionalização da das universidades, pesquisas e revistas científicas tardaram a acontecer, os periódicos têm menos visibilidade internacional e baixos Fatores de Impacto, conforme destacam Angelo Pinto e Jailson Andrade em artigo publicado pela Química Nova:

“Pode-se citar, por exemplo, a pouca disponibilidade de acesso ao periódico em grandes centros científicos; a baixa prioridade na sua assinatura pelas bibliotecas, e fenômenos culturais do tipo: a preferência dos pesquisadores em publicar os seus melhores trabalhos nos periódicos estrangeiros com alto Fi e, especialmente, no caso do Brasil, o mau hábito de muitos dos pesquisadores brasileiros não citarem os seus colegas brasileiros.” (Pinto e Andrade, 1999, p.450)

Milton Ruiz, editor da Revista Brasileira de Hematologia e Hemoterapia em 2009, também criticou, com colegas, o Fator de Impacto em artigo da revista. Eles relatam o caso do periódico Journal of the American Medical Association (JAMA), que conquistou na década 1960 prestígio na área, mas nos anos 1980 passou  e diminuir seu Fator de Impacto. Como solução, o editor da época, George Lundberg, renovou a política editorial da revista com intenção de aprovar periódicos que trouxessem mais citações.

Entre as mudanças, é relatado que Lundberg aumentou as seções da revista, forma de submissões e também de conteúdo, sendo que o editor entrava em contato com autores formadores de opinião, e consequentemente de citações, para que eles publicassem no Jama, estratégia que acabou se espalhando no mercado editorial, ao invés de buscar a publicação de artigos relevantes para área.

Ruiz e colegas ainda apontam como o Fator de Impacto influencia outras áreas acadêmicas, como no financiamento de projetos, revistas e de avaliação dos pesquisadores com a estratégia de cálculo de citações como do Fator de Impacto, prática considerada errada até mesmo por Garfield, visto que pesquisadores publicam menos que uma revista. A pressão fez ganhar força o movimento de produtivismo acadêmico, no qual os pesquisadores precisam publicar cada vez mais para atingirem prestígio e crédito científico.

Vida média de um artigo

Outra crítica recorrente entre diversos autores que debatem sobre o Fator de Impacto, como Lilian Nassi-Calò, Coordenadora de Comunicação Científica na BIREME, é sobre o tempo de maturação de um artigo.

Sobre o tema, Ruiz e colegas ainda ressaltam que a escolha de dois anos para coleta de citações é arbitrária, visto que apenas algumas áreas como as ciências da vida e ciências exatas possuem vida média de artigos curtas, então recebem citações com muita facilidade, motivo para também serem áreas com muitas publicações.

No entanto, áreas como ciências humanas e ciências sociais aplicadas têm um tempo maior para maturação do artigo para ser incorporado na literatura acadêmica, o que acaba por resultar em poucas citações no mesmo período. Mesma ideia é apresentada em gráfico de artigo de Letícia Strehl em artigo na revista Ciência da Informação:

Gráfico de pesquisa que aponta áreas de artigos indexados pelo ISI que não são citados após 5 anos de publicação, com destaque para humanidades que tem processo de produção e maturação dos pensamentos maior que das ciências naturais
Gráfico de pesquisa, apontando as áreas de artigos indexados pelo ISI que não são citados após 5 anos de publicação. Com destaque para humanidades, que tem processo de produção e maturação dos pensamentos maior que das ciências naturais

A autora explica que os dados indicam que cada área do conhecimento apresenta taxas de obsolência diferentes, além dos ritmos de atualizações também não serem as mesmas, por isso que não seria sensato avaliá-las com as mesmas métricas, sem levar esse dado em consideração.

Sobre as áreas, Antonio Pinto e Jailson Andrade ainda complementam que cada área do conhecimento tem um número de revistas diferente comparado à outra, sendo que a quantidade de publicações disponíveis e indexadas no JCR influenciará no Fator de Impacto.

Entre outros problemas sobre o Fator de Impacto, eles ainda apontam que a métrica desconsideram pesquisas de caráter mais regional, as quais podem não gerar muitas citações, mas não deixam de serem relevantes para a região analisada. Sem mencionar que muitas vezes, os artigos recebem citações por críticas a erros conceituais, e não por suas contribuições positivas no debate científico, ou ainda autocitações e outro problemas de boas condutas.

Outro ponto que os autores apresentam sobre o Fator de Impacto é que as revistas que publicam em inglês têm mais vantagens perantes outros idiomas para terem mais citações, o que é compreensível, visto que o inglês se tornou a atual “língua franca” da ciência, como já comentamos aqui no blog.

Por fim, compreende-se que há um consenso de que o Fator de Impacto não é uma ferramenta perfeita, assumido até mesmo pelo criador Eugene Garfield, no entanto, não existe no momento uma outra métrica que possa substituir da melhor forma o popular FI.

Diante de tantos problemas que ele apresenta, principalmente para as áreas de humanidades que não cobre bem as citações e ritmo de produção, este post deixa o alerta sobre as principais críticas a serem ponderadas nas análises e elaborações das políticas editoriais. Bem como a reflexão sobre a necessidade de buscar outras métricas para complementar a visão geral sobre o periódico e sua missão proposta, ao invés de mudar a política editorial apenas para tentar atingir altos valores no Fator de Impacto.

Leia mais:

Referências:

GARFIELD, Eugene. The Thomson Reuters Impact Factor, Clarivate Analytics, s.d., disponível em <“>http://garfield.library.upenn.edu/papers/jifchicago2005.pdf>  

NASSI-CALÒ, Lilian. Declaração recomenda eliminar o uso do Fator de Impacto na Avaliação de Pesquisa [online]. SciELO em Perspectiva ]. Disponível em: <https://dx.doi.org/10.1590/S0100-40421999000300026

RUIZ, M.A.; GRECO, O.T.; BRAILE, D. M. Fator de impacto: Importância e influência no meio editorial, acadêmico e científico Rev. Bras. Hematol. Hemoter. São José do Rio Preto ,  v. 24, n. 3, p. 273-278,  set.  2009 https://dx.doi.org/10.1590/S0102-76382009000400004

Equipe do Galoá science

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