Por que se escreve a Ciência?

A pergunta que dá título a esta coluna já foi parcialmente respondida em outros momentos da história, todavia, há muito que se discutir acerca da escrita da ciência, sobretudo quando essa escrita se articula ao espaço acadêmico.

Por isso que a coluna de hoje será diferente e buscará ajudar os novos pesquisadores a entenderem esses pontos, assim como relembrar os acadêmicos já experientes.

E documentar a produção científica implica qualidades discursivo-textuais relevantes, como as que veremos a seguir:

Escrevemos para relatar um projeto

Eis os passos ou etapas que devem figurar na apresentação de um projeto de pesquisa:

  • Descrição fidedigna do projeto de pesquisa;
  • Grande área e subárea me que se inscreve a investigação
  • Instituição(ões) envolvida(s)
  • Linha institucional de pesquisa
  • Grupo de Pesquisa ou equipe de trabalho (se houver)
  • Objeto e objetivos
  • Questões, ou hipóteses de pesquisa
  • Opção teórico-metodológica
  • Bibliografia inicial
  • Córpus de análise (se houver)
  • Cronograma de atividades/ações
  • Produto esperado (se houver)

Escrevemos para relatar o resultado de uma pesquisa

O texto que documenta uma pesquisa concluída deve conter os seguintes itens:

  • Apresentação sumária do projeto: objeto e objetivos; questões ou hipóteses de pesquisa; opção teórico-metodológica; córpus de análise.
  • Revisão teórica consistente com fontes cuidadosamente indicadas;
  • Demonstração do modelo de análise praticado, sempre que possível;
  • Operação em córpus significativo e, quando necessário, autorizado;
  • Emprego da variedade padrão da língua-objeto (em nosso caso, a língua portuguesa do Brasil);
  • Resumo e palavras-chave (até seis) em uma língua estrangeira de alcance internacional (em nosso caso, inglês ou espanhol)

Esses tópicos descreverão, genericamente, o que se espera encontrar em um relato científico que poderá resultar em contribuições significativas para o progresso da ciência numa dada área.

Escrevemos para saber avaliar a produção

Não há aqui a intenção de propor o controle absoluto da ciência, do que resultariam possivelmente sistemas ou atividades autoritárias de controle que viriam a inibir a originalidade e a liberdade indispensáveis ao espírito inventivo. Todavia é preciso confiar no que se divulga. Logo, avaliar é preciso.

A avaliação da pesquisa é fundamental para que os órgãos de pesquisa possam atuar crítica e reflexivamente; de um lado, na busca de soluções de problemas, de outro, na distribuição mais consequente e democrática dos recursos para a ciência, ou seja, a avaliação é um meio de disciplinar o inventivo à pesquisa a partir da qualidade das propostas e dos resultados apresentados pelos pesquisadores proponentes. Sobre isso, a blioteconomista Maria Helena de Almeida Freitas argumenta em artigo que:

“A produção científica de um país pode ser avaliada em várias instâncias e de variados modos: através do cotidiano das universidades ou empresas, análise dos produtos da atividade científica (patentes, inventos, relatórios, artigos, dissertações e teses etc.), aceitação de trabalhos para encontros científicos ou para publicação (o que pressupõe análise de editores ou pares), análises quantitativas de produtividade e de impacto (via citações), relação de patentes solicitadas, verificação de novos produtos tecnológicos enviados ao mercado, análise das citações de patentes, até avaliações formais e institucionalizadas realizadas por entidades científicas e/ou governamentais.” – Maria Helena de Almeida Freitas em Psicologia Escolar e Educacional (1998)

Para tal avaliação, as instituições criam procedimentos gerenciais que buscam minimizar a subjetividade do processo avaliativo.

Para avaliar a produção e a produtividade científico-tecnológica vêm sendo utilizados alguns indicadores de desempenho, tais como: índice de citações, prestígio dos periódicos onde os trabalhos são publicados, publicações em periódicos que fazem uso da avaliação por pares, levantamento e índices de produtividade e levantamento quantitativo da produção por instituições, áreas do conhecimento, regiões ou países.

Para tal avaliação, as instituições criam procedimentos gerenciais que buscam minimizar a subjetividade do processo avaliativo. Freitas (1998) afirma que para avaliar a produção e a produtividade científico-tecnológica:

“têm-se utilizado largamente alguns indicadores de desempenho: índice de citações, prestígio dos periódicos onde os trabalhos são publicados, peer-ranking (‘onde os pares são solicitados a classificar em ordem de desempenho os grupos de área de pesquisa similar’ (Meneghini & Fonseca, 1990: 631 », publicações em periódicos que fazem uso da avaliação por pares (o que valida o trabalho perante a comunidade científica), levantamento e índices de produtividade e levantamento quantitativo da produção por instituições, áreas do conhecimento, regiões ou países. Castro (1986) considera que o processo de avaliação de pesquisa tem duas vertentes: avaliação pelos pares (‘… ancorada na reputação adquirida pelo avaliado…’ (p. 28) ‘e critérios avaliativos (a bibliometria e a cientometria). Mas que ‘previsivelmente, as alternativas mais interessantes parecem residir em combinações dos dois métodos’ (p.28). O uso de indicadores múltiplos tem sido compreendido como o melhor modo de medir e refletir o desempenho científico também por Meneghini & Fonseca (1990) e Le Pair (1995).” – Maria Helena de Almeida Freitas em Psicologia Escolar e Educacional (1998)

Todos esses meios e modos se ocupam de, a partir dos textos que documentam os projetos de investigação, seu desenvolvimento ou seus resultados, apreciar:

  • até que ponto há uma hipótese de contribuição para a melhoria da vida na sociedade entorno
  • até que ponto o pesquisador (ou a equipe) está preparado para realizar uma revisão de bibliografia sobre o tema eleito
  • estará o estudioso (ou a equipe) apto a produzir uma visão crítica sobre o estado em que se encontram as pesquisas que envolvem seu objeto e interesse imediato
  • terá como testar de algum modo a eficiência de sua proposta de trabalho e etc.

Uma vez validadas as hipóteses subjacentes a essas perguntas, será possível concluir se o projeto e seu proponente, ou os resultados apresentados, de fato promovem o avanço do conhecimento científico na área em que se enquadra.

¹  O texto, cedido espontaneamente pela autora, integra a coletânea: SIMÕES, D. M. P. & GARCÍA, F. (Orgs.). A Pesquisa Científica como Linguagem e Práxis. Rio de Janeiro: Dialogarts, 2014, p. 20-23

Referências do texto:

FREITAS, M. H. (1998). Avaliação da Produção Científica: considerações sobre alguns critérios. Psicologia Escolar e Educacional, v. 3, p.211-228.

Sobre A Autora

Darcilia Simões é professora associada do Instituto de Letras da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), vice-presidente da Associação Internacional de Linguística do Português (AILP), coordenadora do Laboratório de Semiótica (LABSEM) e das Publicações Dialogarts. Lidera o GrPesq Semiótica, Leitura e Produção de Textos (SELEPROT)- Base CNPq. Suas pesquisas privilegiam o ensino da língua portuguesa, com foco principal na iconicidade e na linguística aplicada.